quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Capítulo 39 - Revelações

Agradeci pela música tocada pelo grupo e dei algumas explicações sobre o casamento. O clima era de surpresa e de alegria por parte dos meus amigos e até aqueles que eu só conhecia de vista vieram me parabenizar. Ouvia votos de felicidades, piadinhas, pedidos de convite para a festa e etc. Impressionante como o brasileiro é um povo festeiro. Meu noivado virou motivo de mais festa no bar, acabei pagando mais uma rodada, de tantos que foram os pedidos. Já que a maioria não iria ao casamento, pelo menos ganharam dois chopes de graça. É a vida.

O Samba acabou e ainda ficamos na mesa batendo papo mais algum tempo, abracei e beijei cada um dos amigos e fui para casa antes das onze da noite. Liguei para Lara e contei brevemente sobre a passagem do bar. Minha amada riu, me desejou uma boa noite com bons sonhos e terminou a ligação assim: “Que bom que àqueles fantasmas não rondam mais a sua cabeça meu querido. Te amo! Você terá uma bela semana pela frente, descanse agora. Só aceitei seu pedido de casamento porque tenho certeza que você nunca sentirá comigo o que sentiu no seu último relacionamento! Um beijo, Deus te guarde”.

As palavras de Lara foram como um afago em meus cabelos e me levaram a uma reflexão e uma visita ao passado. Escrevi aqui no inicio dessa narrativa, lá nos primeiros capítulos, e repeti algumas vezes que eu, Herculano, era uma pessoa descrente e desiludida com as mulheres e com relacionamentos. Várias vezes repeti algo nesse sentido, até que Lara me fez mudar essa certeza. Como estou aqui contando minha vida e minhas derrotas, vitórias e erros, acertos, medos e frustrações, acho que chegou a hora de revelar o motivo que me levou a ter essa pseudo certeza. Normalmente nossas certezas vêm de duas fontes: uma grande realização ou uma grande frustração. Minha certeza de que relacionamentos afetivos eram coisas que eu não acreditava mais vinham de uma grande frustração. Frustração oriunda de uma grande decepção afetiva. Nada mais frustrante do que o sentimento de injustiça e relatarei aqui exatamente o que ocorreu e o que eu senti.

Eu sempre acreditei no Amor como sentimento maior do ser humano. Era do tipo que sonhava, acreditava, embarcava de cabeça sem medos ou receios até que um dia Deus me colocou em uma situação que hoje vejo com clareza quais seriam seus objetivos.

Conheci uma mulher que me fez viver uma sensação que eu não conhecia. Na época achei que era amor e mergulhei de cabeça. Éramos de mundos diferentes, crenças diferentes, criações diferentes, horizontes diferentes. Poderia dizer, quase que de mundos. Apaixonei-me por aquele sorriso e pelo desafio que aquela relação representaria em minha vida. Até então, sempre tinha sido movido por desafios. Queriam me ver vibrar era só me colocar perante um desafio, daqueles de assustar e dar medo até no Rambo. Eu não tinha medo de nada, ou quase nada.

Foram tempos difíceis. Inicialmente fiquei cego e surdo. Preferi não ver e não ouvir o que era claro para todos aqueles que queriam meu bem. Dediquei um grande tempo da minha vida a quem não merecia e não dava valor. Vi minha dedicação, meu amor e meu esforço serem desperdiçados e tratados com desdém. Me acostumei a viver de migalhas, sobras e conveniências. Nos momentos difíceis eu estava sempre sozinho e nos momentos bons eu estava sempre acompanhado. Impressionante como ficamos tão cegos e tão idiotas durante períodos de nossas vidas.

Foram tempos muito difíceis. Enquanto eu estava cego, não percebia que essa era a realidade e quando passei a enxergar tudo com clareza, eu era como um dependente químico. Sabia que aquele vício, aquela dependência só me fazia mal. Tentava me libertar, mas sofria com crises de abstinência. Tinha recaídas e me afundava novamente, como dependente que acredita que a droga não lhe causará mais males. Sofri, chorei, vi meus amigos desistirem de me aconselhar e me tratarem como um caso perdido. Sofri e chorei muitas vezes por me sentir tão idiota e impotente perante algo que no fundo eu sabia que só me fazia mal.
Eu sabia que só em Deus eu encontraria forças para sair daquele buraco, daquele círculo vicioso no qual me encontrava. Me refugiei em mim mesmo, busquei dentro de mim e na fé, forças para me reestruturar até que consegui dar meu grito de liberdade. Cortei o mal pela raiz. Dei um basta. Me afastei por completo e tirei da minha vida tudo que me lembrasse esse período nefasto.

Tudo na vida têm efeitos colaterais e como eu havia sofrido muito para me libertar, decidi dentro de mim, que nunca mais me entregaria novamente ao amor por completo. Havia um equívoco em meus pensamentos. Um equívoco provocado pela dor e pelo sofrimento e que hoje, deitado aqui em minha cama com o coração em paz, me preparando para dormir, consigo ver com espantosa clareza.

Durante um tempo eu achei que o amor, que o amar, tinha sido o meu grande erro e a causa de meu sofrimento. Ledo engano que cometi e que hoje agradeço por ver a verdade se descortinar em minha frente. Amar jamais será um erro. O erro é amar e se entregar a quem não te merece. Seu amor é o que você tem de melhor dentro de si, então, use com prudência e com inteligência. De seu amor somente aquele que merecer e que fizer jus. Amar a quem merece só traz alegria e felicidade. Eu estava dando meu amor à Lara e isso só estava me fazendo bem. Lara era minha recompensa por vencer meus traumas e medos. Lara era a cura, ou o sintoma de que eu estava curado. Eu era novamente capaz de amar, um amor puro e merecido.

Nesse momento lembrei-me de um poema que para mim retrata muito bem esse momento e que divido aqui com vocês que acompanham a história de Herculano:

“Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade. (...)
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.”

E agora que vocês conhecem um pouco mais sobre Herculano, talvez entendam melhor algumas coisas que contei até aqui. Talvez perdoem alguns erros cometidos e alguns medos revelados.

Me vejo hoje numa fase ainda de desafios, mas de atos e decisões muito mais conscientes e equilibradas. Muitas surpresas ainda me aguardam!

Peço desculpas, mas vou encerrar por aqui, pois minhas pálpebras pesam sobre os olhos e a semana será dura. Lucas deixou uma série de tarefas em minhas mãos antes de sair de Búzios. Não posso decepcionar meu amigo, sócio e irmão. O sono chegou e com ele uma paz de quem, ao revelar e dividir com vocês meu drama do passado, se libertou de vez. Estou pronto para novos amores, justos, leais, merecidos. Obrigado Senhor por ter me feito viver todo o sofrimento que vivi. Hoje sou capaz de reconhecer o valor de um amor verdadeiro e saudável, e principalmente capaz de distinguir o que é doentio do que é saudável.

Fechei os olhos e dormi como uma criança. Sonhei com anjos e querubins...


8 comentários:

Cláudia Otoni disse...

Lido.
Lembra que no meu comentário falei sobre citações que ficam na memória?
Daqui pra frente, em cada capítulo, comentarei os que mais gostei.
- "Eu sempre acreditei no Amor como sentimento maior do ser humano."
- "Seu amor é o que você tem de melhor dentro de si, então, use com prudência e com inteligência."

Herculano é, definitivamente, um eterno romântico.
Adorei também a citação de "Metade". Bela escolha!

e que venha logo o capítulo 40...

Jussara (Ju) disse...

O amor deve ser vivido como as sabias palavras de Vinicius: Que seja eterno enquanto dure!, mas também deve refletir o cultivar das rosas: para que elas sejam belas e perfumadas devem ser cultivadas e para isso vamos nos espetar algumas vezes, mas o resultado compensa.
Parabéns pelo capitulo de hoje Lennon.

Lennon Pereira disse...

Oi Cacau, Será ótimo ter uma comentarista Oficial, rs. Fico feliz por acompanhar e pelas contribuições.
"metade" é tudo de bom né? beijos

Lennon Pereira disse...

Oi Ju, muito obrigado por acompanhar o livro e por sempre contribuir com comentários inteligentes e oportunos! um beijo.

Anônimo disse...

Lennon,quem é o autor de Metades?Linda poesia.O autor deve ter outras tao lindas quanto essa.De a dica para seus leitores.Parabens pelo capitulo de hoje.O brilho resurgiu como um sol depois das chuvas.

Lennon Pereira disse...

Olá anonimo, da proxima vez deixe seu email, ou mande um para mim! o poema é do poeta maldito, Oswaldo montenegro... desculpe por não citar e obrigado por comentar e acompanhar! fico sempre muito feliz!

Patricia disse...

Voltando das ferias , meio relaxada pelas mornas águas de Porto de Galinhas, li de uma vez os capitulos desde antes do Natal e fiquei maravilhada com o rumo da história.Há algo de psicanálise nas narrativas de Herculano e alguns de seus grilos são muito mais comuns do que se pode parecer. A arte imita a vida, ditado muito repetido pela critica cultural, mas verdadeira mesmo.Parabens e espero mesmo que seu livro chegue às livrarias.Vai ser um sucesso.Agora não vou mais perder um capítulo pois o dia a dia rotineiro nos enche de adrenalina e o sono chega tarde.
Vou aguardar o 40...

Lennon Pereira disse...

Muito obrigado Patricia. Realmente Porto de Galinhas é tudo d ebom. Estive lá, fui a muro Alto, nas piscinas naturais, fiz uns passeios e fiquei hospedado na praia do cupe e tb adorei a vila. Bom demais para descansar não é mesmo? Em breve o capitulo 40. hoje ou amanhã.Quanto a publicação, estou batalhando, não é fácil...