segunda-feira, 9 de março de 2015

A Diva que não quero copiar

Estava eu com as gêmeas, na fila de um famoso laboratório de análises clinicas, para exames de rotina solicitados pela nossa pediatra. Agora que já não sou mais um homem do campo, tenho que me adaptar a essas tarefas complexas de cidade grande. Agendar com antecedência, ficar horas ligando para as famigeradas centrais de atendimento, ouvir musiquinhas intermináveis, para finalmente conseguir aquilo que é nosso direito, realizar um exame médico.
Nos tempos de hoje, talvez envergonhados pela duvidosa qualidade dos serviços prestados no que diz respeito ao conforto e agilidade, esses locais procuram oferecer um mínimo de entretenimento, já supondo que seus pacientes (o nome nunca foi tão propício), passarão ali longas horas à espera.
Por isso, podemos encontrar máquinas de café e chocolate, e Tvs presas nas paredes para que o tempo possa passar mais rápido.
A qualidade da programação da TV brasileira não é lá essas coisas, nem nos horários nobres, de maior audiência. Fico eu imaginando o que pode ter de bom no horário matinal. Graças às minhas amadas filhas, minha dúvida estava prestes a ser sanada.
Eu me distraía com as meninas, contando casos, fazendo brincadeiras (elas também não são muito televisivas, graças aos tempos em que vivíamos na pousada em Búzios), e a programação passaria quase imperceptível, não fosse o fato que narrarei agora:
Começou a me ferir os ouvidos uma voz esganiçada, eu se propunha a cantar algo, mas produzia sons desalinhados e agressivos aos ouvidos. Tamanha desafinação fez com que eu parasse por um momento com as brincadeiras e prestasse atenção à telinha do demônio (apelido carinhoso para televisão).
Lá encontrava se uma moça de cabelos  gritantemente tingidos de loiros, com um rosto totalmente retocado por Botox e seus similares, com carregada maquiagem e uma vestimenta quase que indescritível. Os mais antigos hão de se recordar do exemplo que darei. Aos jovens peço perdão e que recorram ao google para desfazer qualquer dúvida que ocorra. A “moça”(meio quarentona) vestia-se como a personagem de Tina Turner no filme MadMax (famoso nos cinemas pelos idos dos anos 80).

O filme contava a história de uma civilização quase primitiva que sobreviveu após um hipotético apocalipse. As vestes já eram bizarras para aquele tempo, imaginem para hoje??? Por um momento me passou pela cabeça que fosse uma fantasia de escola de samba, mas o carnaval findou-se mês passado e é cedo para o de 2016! Não haviam dúvidas, as vestes eram realmente escolhidas para a apresentação da moça.
Após o espanto com o que eu via, seguiu-se o espanto dom o que eu ouvia. Entre berros esganiçados e palavras difíceis de entender, a moça findava com algo como:
Se der mole, te limpo todinho
Tudo bem, demorô, não faz mal
Passo o rodo e dou uma esfregada
O meu brilho é natural"

Em seguida arremata com a transloucada, presunçosa e egocêntrica frase: "Eu sou a diva que você quer copiar”.
Depressão, espanto, tristeza, decepção...
Parei, respirei fundo, refleti e concluí que o primeiro passo para vivermos num país melhor é escolhermos melhor “as divas” que queremos copiar e dar de exemplo para nossos filhos.

Que Deus me liberte de cruzar novamente com tal figura, mesmo que pela Televisão.

Hora de correr para  casa e limpar meus olhos e ouvidos com um velho DVD que tenho de Vinicius,  Tom, Toquinho e Miúcha.
“... se o amor é fantasia, eu me encontro ultimamente em pleno carnaval...” ( trecho da música Escravo da Alegria de Vinicius de Morais





Até breve!

quarta-feira, 4 de março de 2015

O MEGAPA do Zezinho

Estava eu sentado em minha já cativa mesa no Desacato, a degustar uma generosa dose de Logan com muito gelo, servida pelo meu insubstituível garçom, Chico tricolor, quando Zezinho chegou e apressadamente puxou a cadeira para me brindar com sua agradabilíssima presença e seu humor lascivo e oportuno.
Zezinho ( ou Dr José de Oliveira Brandão, para os pouco íntimos) é figurinha fácil no bairro. Pele morena curtida do sol, pouco mais de 1,70cm de altura, carioca nascido em São Cristóvão e que veio morar no Leblon, quando o bairro ainda não tinha o glamour e os preços estratosféricos de hoje, é médico, dos mais respeitados, mas insiste em circular nos finais de semana de sandálias hawayanas, shorts de tactel e camisetas daquelas que podem facilmente ser compradas no Saara ou no Mercadão de Madureira. Vaidade Zero, Inteligência nota dez! Amigo feito por aqui, em descontraídos papos de mesa de Bar. Zezinho já nos brindou com algumas férias em nossa pousada em Buzios. Lara tem uma admiração especial por esse amigo, que aparece sempre como um raio, sem avisar ou planejar. A intempestividade e imprevisibilidade são suas marcas registradas. De fala rápida e contundente, ele usualmente domina as conversas pois é difícil pensar ou falar tão rápido como o intrépido Dr.
Já chegou pedindo um chopp e com a língua afiadíssima: -“ Herculano meu amigo, esse país não tem jeito! Enquanto vivermos sob o domínio da MEGAPA, não teremos futuro, não sairemos do apagão moral e intelectual que se instalou no Brasil. Esse é o grande mal da nação, não sei como vamos sair dessa meu amigo! não vejo horizontes, está tudo nebuloso, e o pior de tudo é que as nuvens não servem nem para chover onde precisa. Estamos ferrados! “
Confesso que não estava entendendo muito bem aonde ele queria chegar, e aproveitei o momento de rara pausa, quando ele molhou o bico no chopp e o interrompi meio que oportunisticamente:
“Calma Zezinho, me explique melhor, o que  você está dizendo meu velho? o que é essa tal MEGAPA?”
- Como você não sabe Herculano? MEGAPA meu amigo, Mediocridade Geral que Assola o País!!
Vivemos a era da mediocridade. Antigamente era bacana e bonito ser inteligente, gostar de coisas boas, ouvir clássicos, botar os filhos em boas escolas, construir uma carreira, conquistar, vencer pelo trabalho, pelo mérito, pela competência. Galgar vitórias e reconhecimentos com base no conhecimento cientifico adquirido. Conhecer a língua pátria, estudar literatura, conhecer nossos poetas, nossos grandes escritores. Orgulharmos de Machado de Assis, Guimarães Rosa, Euclides da Cunha, Manuel Bandeira, Drummond, Monteiro Lobato...
Agora ditos professores fazem questões de prova citando uma tal de Waleska Popozuda como Pensadora Contemporânea!!! Só pode ser um deboche. Essa mesma sociedade que idolatra essa moça a quem nada tenho contra, mas não vejo nenhum trabalho relevante para a sociedade, quer banir das escolas Monteiro Lobato, um de nossos maiores escritores infantis! Criador de personagens maravilhosos, defensor histórico da soberania, lembra do “O Petróleo é nosso”?
É disso que falo meu amigo Herculano! Isso é o MEGAPA! Um vírus que se espalhou e se instalou na sociedade brasileira. Hoje em dia as pessoas chegam a ter vergonha em ter conhecimento. Se você sabe um pouco mais de história, biologia, ou de conhecimentos gerais é quase discriminado.
Eu mesmo tenho um amigo que as vezes é chamado de radio relógio pelos amigos porque sabe quem escreveu o indo da independência, quem fundou a academia brasileira de letras, quem escreveu o celebre: ”Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá...” ou simplesmente porque sabe dizer a origem do termo “santo do pau oco”.
É o apagão intelectual amigo, a inversão de valores! A Moda é ser medíocre e ridicularizar a cultura e o conhecimento! A Quem interessa isso meu amigo? Só pode ser a alguém que quer continuar dominando a nação, e quanto menos senso crítico tiver um povo, menos capacidade de questionar e reagir essa sociedade terá!
Zezinho nesse momento terminou de tomar o segundo chopp, quase que em apenas um gole, bateu na mesa com uma nota de R$ 20,00, mandou um beijo para Lara, chamou o garçom e se despediu com a frase: “Deveras agradecido pela lhaneza de sempre! Se abstêmio fosse me furtaria desses inenarráveis momentos! Onde abunda o sorriso escasseia o discernimento!” Bateu no ombro do garçom e saiu da mesma forma intempestiva que chegou!

Chico virou-se para mim e disse: - Fala bonito o Dr Zezinho! Só entendi duas ou três palavras, mas pelo tom que ele usou, só pode ser coisa boa, muito boa, afinal a bunda é a preferência nacional não é Seu Herculano?


Até a próxima, com os cumprimentos do saudoso e inspirador Stanislaw Ponte Preta...