terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Capitulo 28 – O destino ajudando?

Mesinhas de mármore e cadeiras de madeira. Na varanda, um deck de madeira. O Tio Sam era um dos mais simples e agradáveis bares do Leblon. Daqueles que você pode ir de chinelo, bermuda e camiseta. Ninguém lá está preocupado com as suas roupas. Todos que vão lá querem beber um chopp gelado, comer um bom e honesto petisco, jogar conversa fora e encontrar amigos. A turma que freqüenta o Tio Sam é uma grande família. Quase todos se conhecem há muitos anos. Quem não se conhece acaba chegando por um ou outro amigo antigo. É daqueles bares sem frescuras.  Não se vai lá para desfilar modas ou grifes e sim para beber e conversar. Lugar de figuras tipicamente cariocas. Futuramente comentarei sobre alguns bem caricatos e divertidos. Se fosse falar de cada um, detalhadamente, teria que escrever outro livro, só com esses personagens. Têm os falantes, os simpáticos, os tímidos, os cantores, os poetas, os sóbrios(será?), as cocótas, os intelectuais, os falidos, os cínicos, os debochados, os atletas, os ricos, os bobos, os alternativos. Tem até os anti-sociais, mas são raros e isolados. Em comum entre a grande maioria eu destaco o bom humor, a alegria e o amor pela cidade maravilhosa. Lá se cultua o melhor do Rio de Janeiro. Futebol, carnaval, samba, boêmia, Cantoria e a principal característica carioca, a alegria!

Quando cheguei ao Tio Sam, Lully já estava a minha espera.
Passei por alguns tipos conhecidos e cheguei até Lully. Dessa vez ela tinha um olhar um pouco triste, diferente da alegria peculiar. Minha cabeça passou o caminho pensando em como eu iria tratar o assunto com Lully. Eu não teria coragem de dizer a ela que estava louco a espera de Lara. Como dizer a Lully, depois do nosso maravilhoso fim de semana, que eu estava decidido a ficar com Lara, a minha namorada que estava em Londres. Como dizer isso sem destruir o coração da moça e sem me sentir o último dos homens e o pior dos cafajestes? Deixei que Lully tomasse a palavra. Mulheres são astutas e hoje ela me daria a maior prova de sua sabedoria. Lully pediu desculpas pelo sumiço e contou que domingo foi um dia difícil. Quando ela chegou, Bené logo a chamou para conversar. Lully contou que Bené se apresentou arrependido, que veio se desculpar. Disse a ela que estava regenerado, que jamais voltaria a ter aquelas recaídas com a vizinha transexual. Disse a Lully que ela era sua salvação e que,com ela, ele teria uma nova vida. Segundo Lully, Bené estava mesmo muito mal. Implorou perdão e uma nova chance, falou dos anos e anos que passaram juntos e etc. Eu logo perguntei se ela havia amolecido, seria para mim o caminho mais curto, mas Lully disse que não. Que ficou triste de vê-lo assim deprimido e arrasado, mas que ela sabia que Bené nunca mais seria o mesmo para ela. Lully ficou tão triste com a situação que chegou a ter febre segunda e terça, motivo de seu silêncio. Ao terminar de contar sobre seus dias, Lully me passou a palavra, eu respirei fundo e comecei a contar do telefonema de Lucas.

Lully comentou logo algo do tipo: “Aquele seu amigo que você e a melhor amiga da esposa serão padrinhos do filho?” Respondi que sim, um pouco impressionado com sua memória e o seu comentário.
Detalhei para Lully o que representava na minha vida a oportunidade oferecida por Lucas, e que não havia como recusar.
Lully ouviu tudo atentamente. Prestava especial atenção a cada detalhe que eu lhe relatava. Ela parecia estar lendo meus pensamentos e decifrando meus enigmas. Expliquei que, até para mim, era tudo muito novo e um pouco assustador. O comentário de Lully, ao final da minha explicação, me deixou surpreso e intrigado com a tão falada astúcia e perspicácia feminina. Novamente relatarei exatamente as palavras de Lully para que antes de lerem as minhas conclusões, vocês mesmos possam tirar as suas. “Que bom meu lindo, fico muito feliz por tudo que está acontecendo na sua vida. Nosso fim de semana e nosso relacionamento também é algo muito novo para mim. Você na minha vida é mais ou menos como seu novo trabalho na sua. Tudo novo, tudo desconhecido. Você faz parte de um mundo diferente do meu. Estar com você também significa vencer desafios, aprender, crescer, me arriscar a rir ou chorar no futuro. Você é de outro mundo, outra estrutura familiar, outros hábitos, outra cultura, outro núcleo familiar, outros horizontes. Você cresceu e vive cercado de pessoas diferentes das que me cercam. Somos praticamente de universos diferentes. Quando comecei a conversar com você,e a te conhecer, foi como se abrisse uma janela para que eu pudesse olhar um mundo até então desconhecido. Eu menina pobre e órfã, de colégio publico e pai biscateiro. Tudo que consegui até hoje foi graças aos meus “padrinhos” e meus esforços pessoais. Vivi com Bené até outro dia, um mundo onde eu controlava tudo. Com você mergulhei num mar durante a noite. Mal sabia onde estava. Confesso que ainda tenho muito medo e receio. Sábado foi ótimo, nunca vou me esquecer. Você me fez viver um sonho, lindo, mas te confesso que voltei para casa com os pés muito no chão. Por melhor que tivesse sido, por mais mágico, uma pontinha de consciência me dizia para manter os pés no chão e o coração sob controle. Algo me dizia para ter cuidado com o dia de amanhã e a enxergar a vida como ela é, cheia de realidade. Por mais lindo que fosse nossa vida não é um conto de fadas, então, pés no chão não faz mal a ninguém. Eu estava certa. Continuo achando mágico estar com você mas vejo agora, depois de tudo que você me contou, que aparentemente nossos mundos estão prestes a se tornar ainda mais distantes. Uma opção sua em apostar numa vida comigo, te levará a muitas reflexões. Já imaginou você um empresário bem sucedido, com um sogro vendedor de mate e limão? Não precisa me responder nada agora meu querido. Quero apenas que você leve a realidade e essas reflexões para casa, que pense nelas com carinho. Eu também precisarei fazer minhas reflexões. Vamos fazer nossos deveres de casa. Sem fantasmas, sem firulas e sem medo da realidade”.

Lully acabava de me deixar tão surpreso que eu já não sabia quem era o menino e quem era o adulto na mesa. A leitura que Lully fez da situação foi tão perfeita, tão clara que eu chegava a desconfiar de tudo que estava ouvindo. De onde vinha toda aquela maturidade? De onde vinha toda aquela coragem? Da infância sofrida? Dos obstáculos da vida? Quem será que dava conselhos à Lully? Aquela interpretação cruel e rodriguiana da realidade,  me deixava boquiaberto e admirado com minha linda e doce Lully. Eu ali, preocupado em como seria minha vida se eu tivesse que dizer a Lully que não poderia ficar com ela, e a menina me vêm com essa.
Antecipou-se e me passou a bola. Deixou claro que eu havia de pensar se realmente estava preparado para o desafio de assumir um relacionamento com a menina pobre. A decisão devia seguir um longo caminho. Passar pelo meu coração e pela minha mente. Apenas uma decisão em que os dois fossem consultados poderia realmente ser a decisão que me faria um homem realizado.

Lully acabava de marcar muitos pontos com aquela conversa madura e inteligente.  Seria isso uma fuga por parte dela para não correr os riscos? Ou seria uma cartada de mestre para me mostrar o quanto Lully poderia me surpreender positivamente? Rita Lee tinha razão...
“Nas duas faces de Eva
A bela e a fera
Um certo sorriso
De quem nada quer...
Sexo frágil
Não foge à luta
E nem só de cama
Vive a mulher...

Mulher é bicho esquisito
Todo o mês sangra
Um sexto sentido
Maior que a razão
Gata borralheira
Você é princesa
Dondoca é uma espécie
Em extinção...”

9 comentários:

Angélica disse...

Sempre surpreendendo! A história está seguindo por um bom e curioso caminho...muito bem :)

cristiane disse...

É,Herculano, "nunca se sabe o que se passa no coração de uma mulher,"ela é como as fases da lua, um dia se mostra um dia se esconde".Cuidado com elas.

Anonimo reconhecido disse...

Cristiane, voce quis dizer "um dia ela se esconde no outro está nua", mas valeu citar o verso do Erasmo.Poucas músicas definem bem o comportamento feminino: "um dia é platéia, um dia atua".

Jussara (Ju) disse...

A historia agora esta tomando novos rumos.Herculano agora vai ter que se definir ou continuará imaturo quanto aos seus sentimentos? Legal incluir reflexões sobre politica.Uma boa alfinetada aos da esquerda bebedores de scotch e parceiros de Color e Sarney.Sua história é muito boa mesmo.Não deixe de publicá-la.

Ellen disse...

Essa história de menina pobre com rapaz rico e que da certo é da carochinha.A Lully esta certa e o Herculano deve buscar rumo.

Lennon Pereira disse...

Isso aí Cristiane, cuidado com elas, esse é o segredo! obrigado pelo comentário!

Lennon Pereira disse...

Obrigado Angélica, minha leitora numero um! beijo

Lennon Pereira disse...

olá Jussara, Acho que você matou a charada. Herculano está amadurecendo. a Vida começa a cobrar mais dele!
Obrigado pela leitura!

Lennon Pereira disse...

Olá Hellen. obrigado pelo comentário e por acompanhar o livro. Realmente Nos contos da Carochinha tudo é fácil...