Passei pelo Estephanios e o
bar estava meio vazio. Lá encontrei apenas com Augusto e mais uns amigos de ocasião.
Augusto era a pessoa perfeita para o tipo de papo que eu procurava. Com trinta
e poucos anos, augusto nunca havia trabalhado. Estudava para ser diplomata ou
coisa do tipo. Seu pai, aposentado do BNDES, bancava seus estudos e suas noites
no boteco.
Augusto falava Frances,
Alemão, Inglês, Espanhol e Italiano. Era formado em três faculdades e um ótimo
papo sobre o comportamento humano. Augusto via o ser humano sem romantismo e
sem maquiagens. Olhava, analisava e dizia o que passava na mente.
Comentei com ele sobre a
conversa com Martha e par aminha surpresa ele só comentou que já imaginava que
isso pudesse acontecer. Segundo a teoria de Augusto, mulher desiludida com
homem é meio passo para se tornar, ou ter uma experiência homossexual. O
assunto ainda era tratado com reservas pelas pessoas, mas Augusto tratava com
extrema naturalidade. Segundo ele, se ela for tratada com carinho e respeito
por Christine, talvez fique para sempre com essa opção. Ainda bateu nas minhas
costas e falou entre sorrisos: “A vida mudou meu amigo. Você ainda é muito
romântico. Hoje é assim. Não deu certo com homem, elas tentam com mulher. É
normal, é a segunda fase da revolução que começou queimando os sutiãs. A competição está se acirrando,
em breve tudo isso será chamado de grande mundo globalizado. Anote aí o que
estou te dizendo!”
Meu amigo era filósofo e
visionário. É bom ressaltar que tais fatos já ocorreram há quase dez anos, e
ele estava mesmo certo, não estava?
Voltando ao bar, Augusto também
me deu alguns conselhos sobre o novo rumo profissional que eu escolhera. Dentre
elas, uma que me lembrava ter ouvido de um velho sábio: “Ninguém fica rico com
a própria força de trabalho. O outro era: Não olhe para a carreira que ficou
para trás. Enterre esse passado e vá como se não tivesse volta. É o que tenho
para te dizer meu amigo Herculano! Como prova de amizade vou te pagar essa
rodada de chopp de hoje! Quando ficar rico lembre se de mim!” Eu sorri e
respondi de imediato: “E você de mim quando for Presidente da República!!”
Algumas risadas, mais alguns
belos papos sobre bossa nova e MPB e ainda tocamos algumas músicas acompanhadas
do violão. Eu acordaria cansado para meu último dia de trabalho. Não estava
preocupado, era passado e Alves já tinha todas as coordenadas.
Cheguei quase onze da manhã. Minha
ausência já não era mais impactante no dia a dia da empresa. Fomos todos
almoçar na Choperia Carioca. Tradicional
restaurante do centro. Mesas com toalhas, Garçons, Pratos como: Goulash,
Vaca Atolada, Língua Defumada, Fígado e outros que hoje em dia são praticamente
“ET’s” nos cardápios modernos.
Dr. Monteiro abriu o almoço
dando o bom exemplo, pediu logo um chop na caneca de vidro. Uma delícia e todos
nós seguimos seu exemplo. Antes mesmo dos pratos chegarem já estávamos na 3ª. Rodada.
Até a Mala da Biranilce estava lá e bebendo. Acho que foi seu primeiro pecado
em público. No meio de um papo sobre turismo a pseudo intelectual disparou. “Meu
sonho é conhecer Fernando de Bolonha,
um paraíso fisiológico no interior
do Oceano Atlântico!” fiquei imaginando o que poderia ser aquilo que Bira
estava descrevendo e fui interrompido por Dr. Monteiro que bradou em alto e bom
som um famoso bordão da época: “Cala a Boca Magda!” Todos caíram na gargalhada
e esse foi o tom do almoço. Depois desse momento, Bira se encolheu um pouco e
deixou a mesa conversar sem ter que ouvir suas asneiras, que alívio.
Muito papo, chopp, risos e
piadas. Dr. Monteiro, aquele homem sisudo estava ali se revelando uma pessoa
que quase ninguém conhecia. Bem humorado, transgressor, piadista e bem
humorado. Dr monteiro já depois do 5º. Chopp levantou e decretou: “Hoje ninguém
precisa voltar ao trabalho. Vamos beber e comemorar a despedida de nosso amigo
que alçará novos vôos. Um brinde ao nosso amigo Herculano, que seja muito
feliz nesse novo caminho!” Todos
brindamos com ele. Ficamos na choperia de 13:00 até às 16:00.
Alguns amigos vieram desejar
boa sorte, outros pediram emprego e outros apenas beberam.
Eu tinha planos de ir até a
repartição conversar com Lully e me despedir também de Dr. Luiz, mas com aquele
clima e cheiro de cerveja, não seria uma boa idéia. Resolvi sair dali e ir para
casa descansar, pensar na vida e me preparar para o reencontro com Lara. Me bateu
uma saudade gostosa dela. Saudade do seu sorriso, do seu astral, daquele olhar que
fascina. Lara era uma mulher e tanto. Uma mulher que deixa qualquer homem mais
forte, mais determinado, confiante.
Coloquei minha coleção de Cds
para tocar, resolvi que aquele fim de dia seria dedicado às musicas românticas
e a preparar meu espírito para receber minha amada. Lara era a mulher perfeita
e ideal para o novo Herculano que estava para nascer. Empresário, homem
dedicado ao trabalho, sócio de um grande executivo de finanças! Lucas já havia
dado entrevistas para Exame, Você S/A e para a hoje extinta, mas famosa na
época, Gazeta Mercantil. Ele era um desses executivos queridos da mídia. Homem
de origem de classe média, nada excêntrico, acadêmico, estudioso, regrado,
casado, família e avesso a badalações da mídia. O exemplo de bom moço. Se eu
queria ser seu sócio, precisava cuidar também da minha imagem e me preparar
para a nova vida que eu estava prestes a
abraçar.
Estava deitado curtindo meus cds,
relaxando e descansando depois do meu almoço de despedida. Tinha selecionado
pérolas dos anos 60 e 70. Estava me distraindo e curtindo as letras profundas
que a MPB é capaz de nos brindar e me detive especialmente em uma pouco
conhecida de Antonio Carlos Belchior, que faz a mea culpa da geração pseudo revolucionária.
“Onde
anda o tipo afoitoQue em 1-9-6-8
Queria tomar o poder?
Hoje, rei da vaselina,
Correu de carrão pra China,
Só toma mesmo aspirina
E já não quer nem saber.”
Confesso que fiquei um tempo pensando principalmente nessa estrofe. Vejo muitos amigos, revolucionários e que bradam por um mundo mais justo, com menos desigualdades. Se dizem comunistas, mas só bebem uísque 12 anos, andam de carrões, Celulares, Notebooks,viajam para os estados unidos todo ano e só usam Lacoste, Polo , Hugo Boss...
Realmente assim é moleza ser comunista revolucionário. As vezes acho que isso é apenas para aliviar a própria consciência.
Estava lá eu perdido em meus devaneios sobre o inconsciente coletivo quando o telefone me trouxe de volta a realidade. Era Lully e vou repetir fielmente suas palavras:
“Oi Herculano, você saiu do seu emprego e nem falou comigo? Liguei para lá te procurando e a secretária me deu a noticia! O que houve? Por que você fez isso assim repentinamente e nem me falou nada? É uma forma de fugir de mim? Está chateado por que eu fiquei uns dias sem dar noticias?”
As mulheres são assim. Somem do nada e quando aparecem, estão sempre cheia de perguntas.
Lully derramou essa avalanche de perguntas e eu mal sabia por qual começar. Pensei em responder uma a uma, mas acho que não era assunto para tratar por telefone. Disse que era uma história meio surpreendente, que foi tudo meio repentino, que mal tive tempo de me adaptar. Não estava mentindo a nova realidade havia caído do céu. Afirmei que eu iria conversar com ela e com Dr. Luiz, explicar tudo, mas que queria fazer isso pessoalmente. Perguntei se podíamos conversar e ela após hesitar um pouco disse que sim, e fui encontrar Lully no Tio Sam do Leblon, o bar do boa praça Chico, que apoiou o pai de Lully quando o mesmo foi abandonado pela mulher.
Acabava de Ir pelos ares minha noite de descanso e música, ao menos era cedo ainda. Eu não queria ter olheiras no aeroporto, mas também não podia deixar de conversar com Lully. Eu também estava curioso com seu sumiço. Tomei um banho e segui para o Leblon.
4 comentários:
.....Lully vai ficar muito triste....
Atualizada! Muito bom e enigmático. Já tenho minha torcida, mas não declaro..
Ericka Querida, Lully é muito mais do que você imagina...
Angélica, obrigado por ser tão fiel e participativa! Beijos para você!!
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