quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Capitulo 18 - Enfrentando a tentação

Como vocês devem imaginar eu não tive coragem de negar o pedido de Lully. Além de ter por ela um sentimento todo especial, que eu não sabia direito ainda o que era, a situação dela me comoveu. E me comoveria se fosse com qualquer outra pessoa.

Disse a ela que sim, que não teria problema, o apartamento tem dois quartos e acomoda bem até três pessoas. Comecei naquele momento a pensar na melhor forma de conduzir o processo de apoio a Lully, sem cair nas armadilhas do coração e da tentação. Lully, frágil e carente, e só nós dois no apartamento era um risco alto demais para eu encarar depois de algumas doses de uísque. Resolvi então que não levaria Lully diretamente para casa. Pagamos a conta e fomos pegar o carro. No caminho disse a ela que a levaria ao bar de uns amigos, o Estephanios, onde eu costumava ir ao samba. A idéia me pareceu ótima. No Estephanios tem sempre um grupo de amigos, faríamos uma “social”, Lully se distrairia com a turma que é realmente muito alto astral, eu poderia beber umas garrafas de água mineral e chegar em casa 100% senhor dos meus atos.

Fomos conversando amenidades e, ao chegar ao bar, minhas suspeitas se confirmaram. Sexta feira era dia de casa cheia. A tropa toda lá, mesa grande, violão, chopp, risadas, cigarros e tudo que compõe uma animada mesa de boteco. Apresentei Lully como minha colega de trabalho, que meio tímida por não conhecer a turma, sentou-se ao meu lado, meio quietinha. Claudia e Jorge, um casal boa praça e bom de copo, percebendo a timidez da moça, logo se aproximaram e puxaram papo. Claudia era assistente social do INCA e Jorge funcionário da Petrobrás. “Quem é essa moça de olhar doce e tímido que você trouxe aqui Herculano? Me conte Lully, como você conheceu esse nosso boêmio amigo?” Claudia sabia como se aproximar de alguém, e a deixa foi ótima. Lully sorriu aquele sorriso lindo e começou a se soltar. Eu fiquei de papo furado com Jorge e disfarçadamente ouvindo a conversa das duas. Era para mim uma grande oportunidade de saber o lado de Lully, como ela me via e como ela narraria nossa história. E Lully se soltou:
“ Ah Claudia, é algo bem incomum. Eu trabalho na repartição e via sempre um rapaz elegante de terno indo lá para acompanhar vários processos. Esse rapaz passava sempre pela recepção, às vezes eu o atendia e,às vezes, uma de minhas colegas. Um dia uma delas comentou comigo que achava o rapaz muito bonito, mas também muito tímido. Ao contrário da maioria dos advogados que passam por lá, ele nunca mexeu nem jogou charme para nenhuma de nós. Depois desse dia eu comecei a reparar mais nele. Só sabíamos seu nome porque a identificação na entrada era obrigatória. Um dia, vendo que ele tinha algumas dificuldades em resolver ou descobrir os caminhos para acelerar os processos, puxei assunto e ofereci ajuda. Eu confesso que fiz isso porque apostei com as meninas que ia descobrir quem era o advogado tímido e misterioso, como nós o apelidamos”. Eu já mal prestava atenção no que Jorge dizia, estava entretido na narrativa de Lully que já me trazia muitas surpresas. Jamais imaginei passar essa imagem na repartição. Eu nunca havia reparado nenhum olhar diferente em nenhuma das meninas, além de Lully, é claro. E agora descobria que ela também não reparava meus olhares. Ou não reparava ou estava mentindo para Claudia. Lully prosseguiu: “Indiquei a ele um dos chefes da repartição, Dr. Luiz e parece que lhe foi muito útil. Herculano, muito educado me agradeceu e passou a ser muito atencioso e cordial comigo. Levava bombons, puxava assunto e começamos a criar essa amizade. As meninas até ficam meio enciumadas porque agora ele só fala comigo quando vai lá. Com o tempo, Herculano me levou no Ao Vivo e também para almoçar algumas vezes. Herculano foi uma dessas agradáveis surpresas que a vida nos apronta. Adoro ele! Educado, Inteligente, atencioso e muito cheiroso. Solteiro e sem filhos!Sorte da mulher que fisgar esse coração solitário e rebelde!” E assim Lully resumiu para Claudia nossa história, de forma simples e natural. Claudia acompanhou com atenção a narrativa de Lully, vez ou outra me olhava com um olhar analítico, e eu fingia não estar percebendo nada. Mal sabiam elas que o termo “sem filhos” estava por um fio. Curioso ouvir assim alguém contar para outra pessoa uma história da qual você é personagem e já tem uma visão. Minha visão era mais romântica do que a de Lully e uma congruência me chamou atenção: Ela também me achava misterioso, ao menos no início. Claudia sorriu e concordou com Lully, disse a ela que eu era o solteiro a ser fisgado da turma, que havia até uma bolsa de apostas! Curiosamente Claudia omitiu o fato de eu ter aparecido lá no bar com Lara e com ar totalmente apaixonado. As meninas já estavam engatadas num papo firme de mulher e foi a vez de Jorge me fazer umas perguntas. De cara quis saber se eu estava enrolado com as três, ou só com duas. Dei uma risada de resignação e confessei: “ Não sei meu amigo, não sei! Até domingo eu achava que Lara era o fim das minhas buscas. Segunda-feiira Martha me veio com uma notícia bomba, que pode mudar todos os meus planos”. Contei então discretamente para Jorge sobre meu papo com Martha na Leiteria Mineira. Jorge riu de forma solidária, sem demonstrar muito espanto, e quis saber de Lully. “E esse anjinho que você trouxe hoje? Como caiu na sua vida? Vocês estão de caso?” Expliquei para Jorge que nunca havia rolado nada entre nós. Tive que jurar com veemência e repetidas vezes até o Jorge acreditar. Minha credibilidade e minha imagem não estavam mesmo muito boas com o casal. Acho que preciso contratar alguém para cuidar de minha imagem - pensei eu com meus botões.

Jorge era engenheiro e funcionário público e, pelo seu perfil de comportamento, tomou a palavra para me dar sábios conselhos: “Olha meu amigo, eu gosto muito de você e quero seu bem, te ver feliz e só por isso vou te dizer o que penso. Lara, a moça de domingo, é linda, inteligente, rica e bem nascida. Além disso, te olhava com um olhar especial de carinho e admiração. Claudia e eu comentamos sobre isso outro dia. Ficamos felizes na esperança de você finalmente encontrar alguém bacana especial, que fosse uma parceira para toda a vida. Um homem só constrói uma vida sólida e segura, quando tem ao seu lado uma mulher de verdade, dessas que somam e que nos colocam para frente, que nos faz crescer pessoalmente e profissionalmente. Rostinhos bonitos muitas vezes podem ser âncoras em nossas vidas. Procure escolher as mulheres que são motores, que impulsionem, que empurrem para frente. Conselho de amigo!” As palavras de Jorge falaram tão forte em minha alma que me deixaram mais sóbrio do que as três garrafas d’água que eu havia bebido. Jorge falava comigo quase como um pai, apesar de ser apenas uns três ou quatro anos mais velho que eu. Suspirei, recostei, passei a mão nos cabelos. As palavras de Jorge me fizeram repassar na mente grande parte das minhas burradas. Eu estava numa idade e fase da vida que precisava tomar atitudes de homem centrado, equilibrado. Não era mais hora de cometer erros infantis e a vida estava me colocando a prova. Agradeci o conselho e prometi a meu amigo que eu faria as coisas e escolhas certas. Eu só não sabia qual das opções era a correta. Talvez Esther soubesse me responder, mas teria que esperar mais um dia. Minha cabeça ficou tão pesada que pedi uma dose de Red Label e o violão. Toquei duas músicas a pedido de Claudia e em seguida uma música que cantei do fundo da alma a última estrofe, meio que num desabafo que só eu entendia:
Talvez o mundo não seja pequeno (Cale-se!)
Nem seja a vida um fato consumado (Cale-se!)
Quero inventar o meu próprio pecado (Cale-se!)
Quero morrer do meu próprio veneno (Pai! Cale-se!)
Quero perder de vez tua cabeça! (Cale-se!)
Minha cabeça perder teu juízo. (Cale-se!)
Quero cheirar fumaça de óleo diesel (Cale-se!)
Me embriagar até que alguém me esqueça (Cale-se!).
Eu só percebi que tinha cantado aquilo com uma rara emoção quando acabei e percebi que toda a mesa, que fez o coro "Cale-se!", estava em silêncio me olhando. Tratei de aliviar o clima dizendo que gostava da música desde pequeno, mas que só há poucos dias tinha conseguido “tirar” no violão. Claudia e Jorge não caíram na minha conversa e para minha surpresa Lully me olhava admirada e com olhos marejados. Esqueci que a mocinha era sensível à arte. Quanto mais eu tentava me desvencilhar dos riscos mais eu me afundava. Resolvi relaxar de vez. Deus sabe o que faz. Toquei duas musicas do RPM para relaxar a turma, bebi mais uma dose, comemos umas porcarias dessas de bar e pedimos a conta - já eram mais de meia noite.

Lully riu muito e interagiu bem e devido ao meu papo com Jorge e ao momento violão. Ficamos a uma distância que não levaria ninguém a imaginar que algo além de amizade havia entre nós. Ótimo para mim. Tudo que eu não queria eram fofocas e fuxicos chegando aos ouvidos de Martha e muito menos de Lara. Fomos para casa e, no carro, Lully me agradeceu pela noite, disse que há muito não se divertia assim, elogiou Claudia e toda a turma, que classificou como: “pessoal do bem”. Quando chegamos eu liguei a TV para Lully e fui direto para o banho. Saí de lá de bermuda e camiseta, levei uma toalha e roupa de cama para Lully. Mostrei onde era a geladeira e disse que ficasse à vontade. Lully me deu aquele sorriso, agradeceu novamente eu ser tão legal com ela, me deu um beijinho no rosto e disse que eu era ainda mais cheiroso assim, logo após tomar banho. Eu ri meio sem jeito e agradeci. Ela entrou no banho e eu no meu quarto, fechei e porta e me deitei. Do meu quarto eu ouvia a água caindo. Comecei a pensar em Lully, ali ao lado, tomando banho, seu corpo nu, a água escorrendo, ela perfumadinha e fresquinha após o banho... Levantei imediatamente da cama e me dirigi até a porta do quarto. Tranquei a porta e fui deitar novamente.

10 comentários:

Mônica Pereira disse...

Não acredito que o Herculano resistiu a tentação!!!
Sua história está cada vez melhor!
Ansiosa pelo próximo capítulo.

Lennon Pereira disse...

Obrigado Monica Querida! Amanhã tem mais!!

Angélica disse...

Herculano é mesmo um homem cheio de surpresas!

Anônimo disse...

Num papo de bar falaram de vc e suas histórias do Astro e esse tal Herculano, um personagem legal (nas palavras da amiga que falaou a respeito) e resolvi dar uma espiada, e gostei muito. Tem traços fortes de uma novela e prende o leitor. Legal.Gostei. Sempre que tiver um tempo vou dar uma espiada para ver até onde esse cara vai conseguir enrolando e se enroscando.Isso mai dar m.....

Lennon Pereira disse...

Muito obrigado Anonimo, fico feliz por gostar e por acompanhar a história! Apareça mais vezes e se puder deixe nome e email para receber o convite do lamçamento!
abraços

Lennon Pereira disse...

Obrigado Angélica a leitora numero um em assiduidade e comentários!beijo

Anônimo disse...

Herculado está se enrolando... kkk

Lennon Pereira disse...

Obrigado Anonimo 2- Acho até que ele se comportou com Lully, pelo menos até o capitulo 18...

Ericka Bacellar disse...

"Educado, inteligente,atencioso e muito cheiroso...." Qualquer semelhança com Herculano é mera coinscidência.......bjs meu amigo!!

Lennon Pereira disse...

Você é muito gentil Ericka, Herculano ficou muito lisonjeado com seu comentário! Obrigado por acompanhar o nosso herói! beijo!