terça-feira, 15 de novembro de 2011

Capitulo 12 – Surpresas a vista

Nada como uma boa noite de sono na própria cama. Não sou daqueles que estranham camas, durmo fácil. Cama, rede, espreguiçadeira, cadeira de praia e outros mais. Mesmo assim tenho que admitir, sinto saudades da minha cama. O sono foi restaurador. Estava cansado demais até para pensar na vida. Dormi sem sonhar, ou sem lembrar do sonho. Cheguei bem cedinho e quando meu chefe apareceu por lá, meu relatório já estava prontinho na sua caixa de emails e impresso sobre sua mesa. O patrão era assim, meio antigo e adorava papéis. Tudo lá em detalhes, dois processos em fase final e os demais problemas com andamento devido. Ele me chamou para sua sala, coisa rara dentro do escritório. Mandou eu entrar e sentar, recostou na sua poltrona de couro preta. Coçou a barba, olhou novamente o relatório, colocou-o na mesa, cruzou as mãos e me olhou por sobre os pequenos óculos de leitura. Eu ansioso perguntei: “o senhor quer mais alguma informação? Algum problema com o relatório”? Dr Monteiro me olhava meio curioso, apoiou-se na mesa e disse que não. “Pelo contrario Herculano, seu relatório está muito bom e o trabalho está bem feito. Chamei o senhor aqui para conversar um pouco. Tenho notado mudanças no seu desempenho. Estive para mandá-lo embora há alguns meses. O senhor me parecia meio disperso e pouco identificado com suas tarefas, mas de um tempo para cá seu rendimento melhorou. Vejo o senhor mais dedicado e empenhado. Chega cedo, conversa pouco e pega os trabalhos mais difíceis, que seus colegas não querem encarar. Meus parabéns, se continuar assim terá bastante futuro aqui na empresa. Como reconhecimento pelo seu empenho, tire a tarde de hoje de folga, vá passear, descansar, faça o que quiser, sei que essas viagens são cansativas. Tenha em mente que estarei mais atento aos seus passos e isso é uma faça de dois gumes. Faça por merecer meu voto de confiança”! Que coisa engraçada, fugir dos meus rolos sentimentais com Lully e Martha me fizeram mergulhar no trabalho e merecer os parabéns do chefe. Tudo na vida tem efeito colateral, uns bons e outros ruins, pensei eu em minha filosofia de botequim. A folga veio em ótima hora, nem precisaria pedir para sair mais cedo para a sessão com Esther. Almocei com Zé, um amigo de uns 50 anos mais ou menos, trabalhamos em parceria em algumas aventuras antes do escritório de Dr. Monteiro. Zé era aquele cara boa praça, bom coração, que fazia a gente ficar feliz só de estar conversando com ele. Ótimo caráter, honesto, amigo e conciliador, tudo para ele estava bom. Fomos almoçar na Confeitaria Colombo. Zé era tradicional, e só gostava de restaurantes com toalhas de pano sobre a mesa. Cada louco com sua mania. A Colombo era mesmo um espetáculo. Anos de história, cristais, dourados, pé direito alto, mezanino e um senhor tocando piano de cauda durante o almoço. O buffet não era barato mas, vez por outra, não fazia mal tirar um tempo para apreciar coisas boas da vida. Eu almoçava descontraidamente com Zé, quando vejo sentada,em uma mesa distante, aqueles cabelos de índia, pele morena, aquele sorriso... era Lully, sentada à mesa da Colombo com um senhor, bem vestido, levemente grisalho, sorridente. Passei a prestar atenção e percebi que o papo era descontraído e os dois aparentavam intimidade. Logo o apetite me fugiu, inadivertidamente minhas mãos ficaram suadas e eu já mal conseguia me concentrar no papo com Zé. Ele logo percebeu e perguntou se havia algo errado. Zé era não só de confiança, mas talvez a melhor pessoa depois de Esther para eu contar qualquer coisa, talvez até melhor do que ela, pois ele não me cobrava os sofridos R$ 150,00 por sessão. Contei rapidamente para Zé sobre quem era Lully e o que era Lully. Ele sorriu e de uma forma quase paternal sentenciou: “Sai fora dessa meu amigo, isso é um caminhão de problemas. Noiva, pai biscateiro, mais nova e te deixando com essa cara de bobo? Tem todos os ingredientes para dar errado”! Para arrematar soltou a pérola: “Herculano, mulher que liga a cobrar não serve para se apaixonar”. Dei uma gargalhada das palavras de Zé, me virei de lado para não ficar na tentação de olhar para Lully e prossegui com o papo e a degustação. Eu comia bacalhau a Gomes Sá e Zé tinha atacado a feijoada do buffet. Comemos, conversamos tomamos café com creme e saímos. Saí sem olhar para trás, mas com aquele friozinho na barriga: quem seria o misterioso, sorridente e íntimo amigo de Lully? Porque Lully não me ligou dia nenhum essa semana? Não sentiu minha falta? Os pensamentos começaram a ficar poluídos e resolvi partir logo para o consultório de Esther. Lá, naquele lugar de paz, eu relaxaria até a hora da sessão. Dessa vez a música ao fundo era Jesus Alegria dos Homens, também de Bach. Perfeita para relaxar. Acordei com a mão de Esther no meu ombro me chamando para a sessão, com aquele sorriso soberano, costumeiro em seu rosto. Sentei na poltrona em frente à Esther. Eu não gostava muito do sofá. Ela me olhou esperando que eu começasse a falar. Fui contando detalhadamente minha semana, falei da alegria com o convite de Lucas e da minha estratégia de ir sozinho para evitar confusões e etc. Depois contei detalhadamente cada fato do fim de semana. Falei de Lara demorada e detalhadamente, contando quem ela era e como era. Quando eu acabei de contar sobre SP Esther interrompeu: “Então Herculano, me corrija se eu estiver errada: Você não vê Martha nem Lully há uma semana e a única mulher com quem esteve foi a surpreendente Lara? É isso? Exceto pelo encontro com Lully no almoço, mas que não conta porque nem falou com ela, correto”? Acenei que sim com a cabeça e Esther ajeitou-se na cadeira como quem fosse começar um breve discurso. Esther sorriu e disse: “Muito bem”e fez silêncio, me surpreendendo. Só isso? Perguntei eu ávido por conselhos e avaliações: Esther sorriu e começou: “Ansioso você Herculano. Vamos lá. Pela sua narrativa, vejo realmente uma situação de conflito dentro de você. Como homem romântico e faminto pela vida, você nutre mesmo um encanto quase que de conto de fadas por Lully. E o fato de ela ser ainda tão cheia de perguntas sem respostas, te fascina e te prende. Martha é assunto que falaremos em outro momento, para não piorar sua cabeça. Agora aparece Lara, que pelo que você descreveu, é a mulher que todo homem sonha. Vejo você numa encruzilhada. Lully te encanta, é a “gata borralheira” por trás da cinderela que você acredita existir. Te prende, te envolve e te faz viajar. Lully é a sua fuga da realidade, sua forma de acreditar que o mundo não é cartesiano e que nem tudo é pratico, preto no branco. Lully faz você acreditar que pode mudar o mundo, talvez mudando a si mesmo ou mudando a vida de Lully. Você só ó saberá a resposta se arriscando e mergulhando no mundo dos perigos e incertezas que é o universo de Lully. Já parou para pensar que você mesmo, lá no fundo, quer que Lully se mantenha um mistério? Você hoje poderia ter se levantado, ido até a mesa dela cumprimentá-la e saberia com quem ela estava. Você preferiu a incerteza, o benefício da dúvida! Lara é real, você conhece, sabe a procedência, família, gostos, educação, até já sabe que o beijo dela é “delicioso”. E já até dormiram juntos(Esther fez uma expressão de empolgação, que eu devia ter lhe passado minutos antes ao descrever a noite de sábado)! Tem todos os atributos que você sonha em uma mulher. Porém Lara é a melhor amiga de Júlia, e você teme desapontar seus queridos e fiéis amigos de tantos anos, afinal seu coração é um barril de dúvidas.Nossa hora está no fim, e vou te dar uma dica preciosa. A vida é real e viver é correr riscos! Já ouviu isso em algum lugar? Meu dever de casa para você: Saia do consultório e viva! Não é para sair fazendo um monte de m, ok? Seja prudente correto, respeite a você mesmo e as pessoas, mas viva meu filho e, antes que você me pergunte, vá para casa, tome um banho fique bem bonito e elegante e vá com Lara ao jantar. Seja você mesmo e me conte tudo semana que vem”! Esther me dera uma sacudida daquelas que há muito eu não recebia. Saí do prédio e nem sabia se deveria ir para a direita ou esquerda. Parei na Letras e Expressões e pedi um café expresso duplo. Precisava por a cabeça em ordem. Bebi o café e me deparei com a seguinte frase: “Eu estive em todos os lugares do mundo e só me encontrei em mim mesmo”. O autor é alguém que acho genial, e para o meu caro leitor que por acaso não conhece ainda a frase, é só ir ao oráculo, ou Google! Paguei a conta e obedeci a Esther. Fui para casa me preparar para o jantar de Lara. O traje era passeio completo. Terno risca de giz grafite bem escuro que eu havia comprado na Via Venetto, para ocasiões especiais. Corte italiano, camisa azul, golas e punhos brancos e sem bolso e uma gravata borgonha. Nó bem feito e lá estava eu pronto para ir buscar Lara, no caminho fiquei imaginando aquela deusa vestida de longo, jóias maquiagem.. quase avancei um sinal pensando em Lara. Parei em frente ao seu prédio na Lagoa e esperei.

9 comentários:

Monica Pereira disse...

Querido, sua história é muito boa e vc sabe que não perco um capítulo. Já te disse e repito, vc tem talento!!!
Estou ansiosa pelo próximo capítulo.
Beijos

Lennon Pereira disse...

Obrigado Querida, logo logo estaremos no 13, 14, 15... Martha está para aparecer...

Rose Marín disse...

O texto prende e aguardo próximos capítulos, fora riqueza de detalhes de locais e sentimentos é impressionante. Parabéns!

Lennon Pereira disse...

Obrigado Rose, Você é uma leitora muito amável e fiel!
boa noite!

Angélica disse...

O próximo, por favor...

Fabricio disse...

Lennon, não fiquei chateado com o caso dos paulistas pois o comentário foi pertinente.Fiz um protesto por dever de ofício de paulistano mesmo.Estava no contexto

Lennon Pereira disse...

Ok Fabricio, tudo bem! Herculano esteve em Sao Paulo, curtindo as delicias e os encantos de seus restaurantes!
Grande abraço!e obrigado por acompanhar a história

Ingrid disse...

mais um ótimo capítulo! e q venha o próximo!!!

Lennon Pereira disse...

ja está lá irmã!