sábado, 19 de novembro de 2011

Capitulo 16 – O Almoço com Martha

Um dos emails do Dr. Monteiro orientava a equipe para levar à mim os casos mais importantes da semana, para que eu ajudasse ou levasse à ele, por telefone, para alguma orientação especial. Alguns colegas vieram até a mim e trataram alguns assuntos. Ao fundo uma voz esganiçada falou para todo o escritório ouvir: “Meus processos trato eu sozinha, não preciso de benção de ninguém”. A voz era de Bira, na verdade seu nome era Biranilce, junção dos nomes de seus pais, Ubirajara e Evanilce. Perderei um tempinho aqui divertindo vocês descrevendo quem é essa figura, pois tenho certeza que o papo com Martha será tenso. Biranilce é a assistente administrativa do escritório do Dr. Monteiro há uns anos. Têm uns 35 anos e até hoje nunca conseguiu passar na prova da OAB. Bira jura que foi a primeira aluna do curso de direito por correspondência da Universidade. Veio parar no escritório a pedido de Evanilce, que era passadeira na casa dos pais do Dr. Monteiro, que numa crise de generosidade, adotou a peça. Bira era a rainha do saber. Qualquer assunto que fosse abordado por algum colega ela dominava e dava aula. No meio das explanações sempre soltava pérolas do tipo: “Na minha concepção da palavra”, “ à nível de entendimento”, “se eu soubesse eu tinha trago pra você o livro”, “quer que eu te ajudo?”, “quer que eu fico até mais tarde?” além de se orgulhar de ser adEvogada, é claro. Bira se orgulhava também de ostentar seus dois grandes triunfos na vida. Lado a lado em sua mesa. O premio de Miss Suéter 1988 do clube Mackenzie no Méier, coração do subúrbio carioca e o quadro de funcionária do mês na extinta loja de roupas masculinas, focada nas classes “d” e “e”, Impecável Maré Mansa, que tinha como slogan, “aqui você compra em dez vezes, sem entrada, sem juros e sem fiador”. Bira era conhecida pela sua chatice. Uma vez no bar do Seu Tuninho, pequeno boteco desses de balcão e mesas, o bonachão e bem humorado coroa perdeu a linha. Nossa turma estava em uma das mesinhas e Bira encostada no balcão falando sem parar. Tuninho andava para um lado do balcão e Bira ia atrás, ele andava para o outro e ela o seguia. Depois de uns 45 minutos de fala ininterrupta, Tuninho bateu no balcão e berrou: “isso é uma covardia, você aí fora e eu preso aqui dentro, não tenho como fugir de você!” Bira pagou a conta e ficou uns seis meses sem retornar ao bar. Certa vez, numa festa de fim de ano o golpe final. Sempre quando o funcionário ia receber o cheque da PL, Gildásio, funcionário da contabilidade e gaiato por natureza, colocava uma música para ilustrar a personalidade de cada um. Nesse dia, na vez de Bira, Gildásio maldosamente colocou uma pérola do ícone brega Falcão, a estrofe dizia: “Você até parece, olhando assim de longe, muito longe, com a Xuxa. Mas de perto é cara daquela atriz que no filme da Branca de Neve fez o papel da Bruxa. Para ter esse seu corpinho de modelo, eu sei, não precisa nem fazer dieta. Quando eu sinto o seu corpo no meu corpo, lembro da minha bicicleta. Mas esses são detalhes tão pequenos em você, que nem mesmo Roberto Carlos com toda aquela conversa mole pensaria em descrever. Você tem a sutileza de uma baleia que desliza numa sexta-feira santa no oceano. Sua elegância chega a me comover, pois eu me lembro da minha vaca galopando...” Bira pegou a PL e não foi mais vista naquela semana. A moçoila só retornou dia 3 de janeiro, primeiro dia útil do ano. De resto Bira era legal. Sua musa inspiradora era Karla Perez, com quem dizia dividir o mesmo gosto, pois as duas tinham como hobby, “um pretinho de seda”. Abandonada já pelo segundo marido, Bira era figurinha fácil nos shows do Elymar Santos, José Augusto e, é claro, do Wando, de quem tinha uma foto autografada sobre a sua mesa. Seu lema era: “homem feio é que é bom, dá no couro”. Resolvi ignorar o comentário de Biranilce e seguir com meu trabalho, em breve teria um papo provavelmente desgastante com Martha. Cheguei pontualmente ao meio dia e Martha já estava lá. Dois beijinhos e fomos para a mesa. A Leiteria Mineira é outro tradicional restaurante do centro do Rio. Mesas com toalhas vermelhas por baixo e brancas por cima, garçons de paletó branco e gravata borboleta preta e cardápio farto. Eu pedi o picadinho de carne e Martha pediu o ensopado de frango. Antes dos pratos chegarem Martha disse que era para eu esperar ela falar tudo e só depois me manifestar. Eu ia beber um refrigerante mas, depois dessa colocação, pedi ao Mesquita um chopp. E Martha começou: “Herculano, eu sei que nós nunca tivemos compromisso e jamais te cobrei algo em relação a isso. Somos adultos e sabemos bem o que fazemos. Acontece que nas últimas vezes que estivemos juntos, eu te senti tão carinhoso e atencioso comigo que acho que criei certa expectativa. Aquela coisa de dormir na sua casa, tomar café da manhã juntos e você me deixar no trabalho começou a me fazer bem e eu comecei a pensar em você de forma diferente. Você deu uma sumida da turma e do samba, e me apareceu lá ontem, com aquela bonequinha de porcelana e eu parei para analisar. Vi você olhar para ela de uma forma que nunca olhou para mim, nem para outra mulher, desde que eu te conheço. Resolvi então conversar com ela, para saber quem era aquela mulher por quem você parecia enfeitiçado, encantado. Lara é realmente muito simpática e agradável, mulher de boa família, de berço. Tem lá seus riscos, mas isso é coisa da vida. Ela falou de você também com admiração e carinho especial, e isso foi muito importante para que eu amadurecesse o assunto o qual vim falar com você. Não quero interferir no seu romance que se inicia. Sempre fomos amigos e podemos continuar a ser, porém, agora existe uma novidade. Vou hoje à minha ginecologista e existe uma chance de 90% de eu estar grávida, de um filho seu. Filho esse que se for confirmado eu terei com muito prazer e orgulho, sem que para isso você precise ser meu namorado ou qualquer outra coisa do gênero. Só precisará ser meu amigo e naturalmente pai”. Eu já estava quase pedindo o segundo chopp. Era muita informação ao mesmo tempo. Martha interessada em mim como parceiro, como compromisso e depois possivelmente grávida. Fiquei calado um tempo, assimilando o golpe. Comi minha comida que desceu meio sem gosto. Martha estava lá, firme, não esboçou quase nenhuma emoção. Determinada, objetiva, forte, e eu lá meio sem saber o que dizer. Pensei muito enquanto comia e foi minha vez de falar. Disse a Martha que não fugiria das obrigações de pai, que sempre quis filhos, mas de forma planejada. Se acontecesse por acidente, iria avaliar na hora. Disse a ela que o romance com Lara estava muito no começo, foi algo inesperado que aconteceu assim meio sem querer, mas realmente Lara havia mexido muito comigo e eu estava vivendo uma nova e agradável experiência. Afirmei à Martha o meu carinho e o quanto ela era especial na minha vida, mas que sempre fomos acima de tudo, amigos. Martha sorriu e concordou comigo. Comemos pudim de leite já com o clima menos tenso entre nós. Conversamos outros assuntos, pedi que falasse do trabalho da família e etc. Martha estava em um bom momento, feliz, cheia de realizações profissionais. Por um momento olhei seu rosto e a imaginei mãe, grávida, barrigão, rosto redondo, carregando em seu ventre uma criança, que seria meu filho. O pensamento viajou, por alguns minutos fiquei ali admirando a peça que a vida poderia estar me pregando. Eu que sempre fugi de relacionamentos estava apaixonado por uma mulher e provavelmente prestes a ser pai com outra mulher. Que mundo louco esse. Paguei a conta e na despedida Martha me abraçou. Disse que só me procuraria após o resultado do exame. Deu-me um frio na barriga. Um turbilhão de pensamentos invadiu meu cérebro. Respirei fundo e disse apenas ok, e fomos cada um para o seu lado. Voltei ao escritório determinado a me entupir do meu novo ópio, o trabalho. Mergulhei nos processos para descansar a mente. Saudades de Lara e a possível gravidez de Martha eram torturas que eu não podia sanar. Trabalhei até as dez e meia na segunda, na terça e na quarta feira. Sem telefonemas, sem bares, sem nada. Casa, trabalho, casa. Até o almoço eu pedi no escritório. Quinta feira eu cheguei mais aliviado, sexta seria o dia de ver Esther e, com certeza, minha psicóloga me aliviaria as tensões e os pensamentos. Após o almoço meu telefone tocou. Do outro lado uma voz conhecida e doce, aos prantos falou comigo “meu lindo, estou muito triste, você pode encontrar comigo depois do trabalho?” A voz doce e chorosa do outro lado era de Lully Flor. Sem pensar muito respondi que sim e perguntei o que havia acontecido. Ela se limitou a dizer que me contaria tudo mais tarde, agradeceu e ainda chorando despediu-se me mandando um beijo. As seis horas da tarde de quinta feira, eu estava no Ao vivo à espera de Lully Flor.

12 comentários:

Anônimo disse...

shii!Acho que virão duas gravidez juntas.Quem sabe 3?

Lennon Pereira disse...

hehehehe, bo aAnonio, o futuro a Deus e ao autor pertencem, risos e abraços

Ellen disse...

O Herculano merece mesmo um susto pois fica brincando com o sentimento dos outros.Bem feito!Estou ansiosa para saber o que a Lully tem para contar.Será que o anônimo está com a razão?

Lennon Pereira disse...

Querida Ellen, se me lembro bem, Lully e Herculano nem ao menos se beijaram... será que ela esté grávida de Bené?
Obrigado pelo comentário e pela leitura, amanhã tem mais...

Angélica disse...

É...tá tenso! Mas o que quero mesmo é saber o que Esther dirá para Herculano...

Anônimo disse...

Se tudo der certo, vai dar zebra!!! Martha grávida... caraca! Mas ela não estará e é só pra criar uma tensão... será?? aguardando o próximo capítulo.

Lennon Pereira disse...

Olá Angélica! só posso dizer que a cabeça de Esther é cheia de suspresas! obrigado pela leitura de sempre! beijo

Lennon Pereira disse...

Olá Anonimo, Será que é só um clima ou nosso herói será papai? e se forem gêmeos? vamos ver como se desenrola esse novelo hehehe. obrigado pelo comentário e por acompanhar a história!

Ellen disse...

É mesmo, Lennon, o Herculano ainda não teve a sua noite de amor com a Lully, mas ele é tão sedutor que eu já havia me esquecido...Mas ela não escapa, há , isso não, é questão de tempo.rs,rs,rs

Sonia disse...

Parabéns ! É uma leitura super agradável , li tudo em pouco tempo.
Estou ansiosa pelos próximos capítulos.

Lennon Pereira disse...

Boa noite Hellen, obrigado por acompanhar a hostória! O capítulo 17 vai aumentar sua curiosidade sobre Herculano e Lully. Beijo!

Lennon Pereira disse...

Olá Soninha! É um prazer ter você aqui como leitora! muito obrigado!